sexta-feira, novembro 28, 2008

o chiu manuelino

Não é nada fácil fazer política em Portugal. Corrijo: não é nada fácil fazer política em Portugal nem em lugar nenhum. O problema não reside nos políticos. O problema, são os eleitores.
A coisa resume-se em duas penadas (isto para falar num escorreito simplex, cumprindo à lei as indicações governamentais, que, no caso da utilização deste arrazoado simplificativo da linguagem e procedimentos tradicionais, é coisa transversal – outra palavra que tem entrado vertiginosamente, no léxico dos portugueses – e imagem de marca do governo socrístico, que neste momento, o homem é mais um cristo que o crates).
Mas dizia eu, e com inteligência, que a dificuldade de se fazer política, não está tanto nos políticos, mas nos eleitores. Como se sabe, um político existe, tem nome mais ou menos por extenso conforme os votos que consegue fazer confluir sobre si, sobre as suas opiniões ou sobre as opiniões que diz serem suas, eleição após eleição. É-se tanto mais político, quanto mais eleitores confiarem na sua palavra, na bondade da sua opinião. Se se mantiver firme na opinião que tem sobre este ou aquele assunto, ele terá, garantidamente, estes ou aqueles votos. Na genialidade da sua prática, está a capacidade de tradução, nas suas mais variadas opiniões, esta possibilidade e o seu reverso. Quanto mais puder/souber proceder desta maneira, mais votos garantirá. De uma maneira, porque e persistente; de outra, porque sabe dar a mão à palmatória. O que é preciso é que uns e outros não saibam da sua outra vida. Tal como num casamento, no que diz respeito aos casos fora dele. Por um lado, sabe-se, se ele mantiver a sua opinião, isso pode ser considerado «teimosia» e ninguém quer um teimoso a dirigir a nação. Por outro lado, saber manter a opinião, demonstra carácter, capacidade para ler pelos seus próprios olhos. As pessoas mudam de opinião. É da natureza das coisas e das pessoas. O que pensava antes ser assim, penso agora ser assado. Se o político não percorrer a estrada da renúncia com os seus eleitores, não é digno deles. Ponto final. Mas saber manter a sua palavra, é coisa de homem, essa e que é essa. E é neste mundo que o político vive: umas vezes peixe, outras vezes carne.
Isto deve ter pensado Manuela Ferreira Leite. Primeiro não falava nada. E vai daí, o povo social-democrata desatou a berrar, aqui-del rei que a mulher não dá instruções às hostes, que assim e que assado. Até que a senhora, cansada de tanto burburinho, de tamanhas manifestações de orfandade política, decidiu dizer algumas coisas acerca de Portugal e do mundo. E disse. Por exemplo: que o casamento devia ser restrito a seres capazes do truca-truca – nas palavras ainda audíveis de Natália Coreia – com vista à procriação; depois, que as grandes obras do estado ajudavam a debelar o desemprego, sim, mas de países distantes, como Cabo Verde e a Ucrânia; a seguir, que a comunicação social é um poder demasiado importante para que se deixe nas mãos dos jornalistas a decisão do que deve e não deve ser publicado; e há dias, que se devia suspender a democracia durante seis meses, para efectuar as reformas indispensáveis… Tudo coisas que dão que pensar, sejam elas dirás em tom bem-humorado, ou não.
Na verdade, a bem da democracia, ainda nos vai valendo Manuel Alegre, para fazer oposição.

segunda-feira, novembro 17, 2008

pouca educação

Cento e vinte mil professores estiveram na semana passada, nas ruas de Lisboa, envolvidos em manifestação gorda, que a bulimia atávica da ministra da educação alarvemente regurgitou, como é, aliás, seu costume.
Tão capaz, como ela, de lançar fora o que os estômagos autocráticos não conseguem resolver, o primeiro-ministro contra manifestou-se imediatamente em Coimbra na primeira oportunidade que se lhe ofereceu, amparado pelo aparelho socialista, incapaz já (por tão peneirado e refinado que está) de fazer mais que amparar as cabeças estonteadas dos seu líderes, no gesto convulso do regurgitamento.
A intervenção do primeiro-ministro não tem explicação. Nem a mudança de rumo anunciada por Manuel Ferreira Leite, – a autora absoluta do conceito de silencio enquanto discurso recorrente e caudaloso, - que antes dizia fragilizar o governo e a sua autoridade, qualquer amaciamento nas relações com os sindicatos, que se querem musculadas e firmes, argumentando desde sábado, (viajando à boleia da manifestação), precisamente o contrário, mudança essa que permite a Sócrates o ataque aos professores, tal como o desenhou, aproveitando e batendo na sua oponente com a propriedade habitual.
A seguir, foram os alunos, a descer a rua, manipulados ou não, mesmo que não soubessem porque razão é que estavam ali… Afinal de contas, bastava o facto de garantidamente usufruírem de um feriado extra calendário… E quem é que não gosta disso?
O que é um facto indesmentível, é que sem professores, não há educação. Se o estudante, o aluno, é o agente central do processo educativo, não é menos verdade que, sem o professor, se extingue o estatuto do aluno e o seu protagonismo. Um, sem o outro, não sobrevive, porque não existe. Ostracizar uma das partes, como parece estar a fazer a senhora ministra, faz desmantelar esta equação. E nesse gesto suicida, a senhora faz tombar por terra a necessidade da sua própria existência: para que há-de servir uma ministra da educação, se não houver educação. Ou se a educação estiver entregue nas mãos de particulares? E é aqui que pode residir a chave para o problema…
Ao afirmar que, naquele sábado de luta, e perante a informação dos milhares de professores na rua, não terá sido aquele «o seu pior dia», a ministra garante a vida difícil que tem tido.
Nestas condições, e em mero exercício de compaixão, o melhor é tirar-lhe de cima dos ombros, a razão de tanta crispação, de tantos dias difíceis.