sexta-feira, julho 15, 2016

o campeonato europeu e a europa

Se a vitória da equipa nacional de futebol no campeonato europeu é épica, sem dúvida que a penalização que portugal vai sofrer da União Europeia é proxeneta.
O que uma coisa tem a ver com a outra, desconheço. Mas vamos à primeira parte desta improvavel equação:
Com a vitória lusa em Paris, por todo o lado hastearam-se as bandeiras e o hino levou uma coça como há muito não se ouvia. Num momento destes, empolgante, perdoamos - pois está claro - as desafinações recorrentes, a prosódia aldrabada, mesmo o texto aqui e ali truncado. Mas quando a canção é entoada muitas vezes, o erro fica insuportável porque muitas vezes repetido. A verdade é que a generalidade dos portugueses não conhece o hino, o texto e o seu arcaboiço simbólico, a música de que é feito, porque não têm na orelha as referências melódicas básicas. Somos duros de ouvido, a começar pelos jogadores que o entoam, habituados ao intervalo primário do sol e dó nacional, recorrências musicais mnimalistas elevadas a ditado e a lei.
Dizem os portugueses, enquanto não chegam à estafada expressão do "não tenho palavras", o que demostra uma iliteracia galopante e uma incapacidade de reflectir com a língua absurda, que a apitadela do árbitro aos cento e vinte minutos do jogo com a frança, foi a porta de entrada para o momento mais feliz das suas vidas. E não é apenas um espectador que o diz... Foram muitos, tantos tantos, que fez mossa. Foram centenas, ao longo das longas horas, os testemunhos ouvidos pelos repórters de todos os orgãos de comunicação social, que afirmaram ser aquele o dia mais feliz das suas vidas. Mas será que não têm vida? Ou que as suas vidas são tão insignificantes que uma vitória - importante vitória, diga-se - os preenche como nenhum outro acontecimento até então? Será que nunca viram uma montanha? Um pôr de sol que não se esquece? Nunca foram espectadores de um arco iris incrivelmente desenhado? Nunca experimentaram uma cerveja a estalar num dia de calor? Nunca comeram umas papas de serrabulho extraordinárias? Nunca se restabeleceram de uma doenca que os enfraqueceu? Para já não falar dos filhos que nascem, dos filhos que se salvam, dum redentor beijo de mãe... Que vidas têm sido as deles, e as nossas, que deixamos esqueceidos todos estes momentos, em prol de um outro, que tem com ele a força incrível e desmesurada do colectivo, como aconteceu agora? É isso que mais importa, as coisas que sofremos e gozamos juntos?
O que é certo é que a vida nao acaba nem começa com o europeu de futebol, com a europa ou tão simplesmente com o euro.
Nao basta a Centeno ter posto o cachecol de Portugal aos ombros (onde é que já vai a ideia do pin na lapela?) e ido para a reunião dos manda-chuvas das contabilidades dos países europeus, lembrando a nossa superioridade, que para eles, a cena é a mesma. Paguem e não bufem. 
Não acenderem as luzinhas da torre eiffel em homenagem aos vencedores é o menos mau dos castigos. Doi porque se vê. 
Já a sansão da europa a Portugal, dói porque se sente.

Não há palavras...

uma crónica antiga - 29 junho

Para todos aqueles que dizem que não há dinheiro em Portugal e que as condições de trabalho em Portugal são escassas e, tatas vezes precárias, aqui está o desmentido. O microfone lançado ao lago pelo capitão da selecção, custa quase trezentos euros. Trezentos. Ora, convenhamos: o lancamento de engenhos que custam trezentos euros o espécime, ainda por cima para lugares tão recônditos e de tão difícil acesso, por exemplo um lago, que impedem a sua recolha imediata e posterior utilização, prova exactamente o contrário. É uma coisa elitista, uma espécie de golfe, Não é bom exemplo, porque não tem taco, no sentido duplo. Mas tem pudle, e caddie, e tem gente muito avantajada a fazer a sua prática elitista. Talvez seja, por razões óbvias, mais parecido com o arremesso de peso, só que sem estilo, o que é uma pena.
O lancamento até nem foi nada de especial. Um pouco efeminado, até. A menor extensão do braço, demasiado relaxado no momento em que larga o engenho, indiciava um gesto pouco empenhado, pouco dedidido, mesmo que a pega do engenho tenha sido uma coisa batalhada. O jornalista numa primeira investida ainda conseguiu defender a propriedade do engenho, segurou-o com vigor, mas na investida seguinte já não conseguiu retê-lo e, no assédio prosseguido, o microfone lá foi, f-f-f-f-f, rompendo o vento, e testemunhando a temperatura da água.
Imagino que o jornalista tenha ficado surpreendido. Ele que só estava a usar o microfone na primeira acepção e primária.
Enquanto que o capitão da selecção lusa, qual criança a quem pôem à frente uma coisa daquelas, com logo em espuma vermelha e tudo, imaginou que poderia fazer com ele outras coisas. Agarrou-o num primeiro impulso e enquanto que jornalista, bisbolheteiro, o defendia sem grande denodo, diga-se, pensando que o putativo entrevistado iria assenhorear-se do futuro engenho mas nesse momento apenas engenhoca para reter a fala e nunca mais o largaria, segurou-o com convicção. Estava longe de imaginar que o putatito entrevistado apenas queria o engenho para se livrar dele imediatamente.
Ao jornalista foi-lhe dito, no momento da sua formação, que o microfone nunca se passa para a mão do entrevistado. O microfone é o símbolo maior do poder praticado na opinião e deve permaner nas mãos, e na posse, da entidade que deve ser poderosa, que deve guardar o poder, o que faz as perguntas e responde perante o patrão do orgão de comunicação. Ao deixar ir o microfone com o entrevistado, seja ele quem for, daixa ir o poder, fica esvaído dele e, a seguir, muito provavelmente, também do emprego, porque entregou o poder que o dono do orgão de comunicação social, detém.
Imagino o bailado do microfone, em câmara lenta. Rodando e rodando, tomando o vento uma vez, dando uma volta sobre si próprio e tornando à aragem outra vez, e assim sucessivamente.
F-f-f-f-f-f-f-f-f-f-f-f-f-f, pluf.
Esta é a língua que o microfone fala.
Uma língua que se cala, trezentos euros depois de sair da loja e depois de muito perdigoto recolhido.

A indemenizacão pedida pelo CMTV não pode ser inferior ao custo do material danificado. 

uma crónica depois do tempo - 14 de junho

Por estes dias, o futebol inunda o mundo, submerge-o absolutamente. Este vai ser um junho afogado, sem espaço nem ar para que livremente se respire. De frança, o campeonato da europa salta para a primeira página das atenções dos portugueses, atiça-lhes a cabeça e a atenção, e não deixa espaço para mais  coisíssima nenhuma.
A atenção dos media é avassaladora.
Na medida da minha exasperação.
Num momento em que vida e morte se proclamam como um grito extraordinario, de portugal para o mundo, é ao futebol que se vai arremedar tema, fazer arder conversa, dirimir pontos de vista.
Os comentadores futeboleiros, que por estes dias se multiplicam como cogumelos, mas dos venenosos, fazem fila em frente dos microfones e câmaras e páginas dos jornais deste mundo e de todos os mundos, com ar de quem sabe tudo, nunca se engana e raramente tem dúvidas, acerca do pontapé na bola e derivados, dando ares de intelectuais iluminados a quem a  humanidade deve agradecimentos sem fim. São insubstituíveis por estes dias, porque só eles existem, mais a sua insuportavel verbe, construída a partir de lugares comuns que, pelo seu basismo, me incomodam, no que não são nem poderiam ser, mas no que insinuam parecer ser, perante a idiotice geral. Mais o Pedro Abrunhosa e o pseudo-hino e o raio que os parta…
Peço desculpa. Entusiasmei-me. Eu que até gosto do Pedro Abrunhosa…
E, contudo, uma crianca nasceu miraculosamente, cento e tal dias depois (dezassete semanas) da morte cerebral da mãe, funcionando essa mãe, para consubstanciar o milagre, como incubadora humana somente. Um milagre da ciência portuguesa e, por isso, um não-mlagre, que tem colhido a admiração geral pelo mundo fora, onde ainda há aldeias e gauleses e espaço para mais que o império romano e as invasões consequentes.
Mas mesmo assim, perante o milagre desta vida que se quis vingada para além da morte da mãe, é só da bola que se fala, como se da vida fosse, e nada menos do que ela.
Ha três dias, num bar de Orlando, um alienado que assistiu ao espectáculo escabroso de dois homens beijando-se, decidiu purgar a humanidade de gente de tal raça, e matou cinquenta, deixando outros tantos feridos com maior ou menor gravidade. Uma atrocidade sem nome que atravessou o coração da humanidade deixando um rasto de destruição. Um acontecimeno realmente importante que a todos deveria questionar, desapareceu das preocupações nacionais. Porque aconteceu com uma comunidade de que queremos distância? Porque aconteceu longe?
E, apesar do horror da noticia e consequente ressaca, é de futebol que as nossas bocas e ouvidos se ocupam, matéria mais importante e mais fundamental para as nossas vidas.
Quem somos nós, de que massa somos feitos, se são assuntos como estes, que deixamos que nos ocupem a atenção por estes dias?
Nao somos melhores que ninguem mas, convenhamos, não nos deixemos fazer piores que ninguém.
Nao nos deixemos embarcar em ridiculos golos cantados na rádio e histórias pseudomágicas que só servem para apoucar a nossa inteligencia.

Entretanto, jogou Portugal. E empatou. A culpa é de Lourenço, Lourenço Salvador, o bebé miraculado, que não torceu suficientemente pela selecção lusa. Definitivamente, não merece a nossa preocupação.

o campeonato europeu de futebol e a europa

Se a vitória da equipa nacional de futebol no campeonato europeu é épica, sem dúvida que a penalização que portugal vai sofrer da União Europeia é proxeneta.
O que uma coisa tem a ver com a outra, desconheço. Mas vamos à primeira parte desta improvavel equação:
Com a vitória lusa em Paris, por todo o lado hastearam-se as bandeiras e o hino levou uma coça como há muito não se ouvia. Num momento destes, empolgante, perdoamos - pois está claro - as desafinações recorrentes, a prosódia aldrabada, mesmo o texto aqui e ali truncado. Mas quando a canção é entoada muitas vezes, o erro fica insuportável porque muitas vezes repetido. A verdade é que a generalidade dos portugueses não conhece o hino, o texto e o seu arcaboiço simbólico, a música de que é feito, porque não têm na orelha as referências melódicas básicas. Somos duros de ouvido, a começar pelos jogadores que o entoam, habituados ao intervalo primário do sol e dó nacional, recorrências musicais mnimalistas elevadas a ditado e a lei.
Dizem os portugueses, enquanto não chegam à estafada expressão do "não tenho palavras", o que demostra uma iliteracia galopante e uma incapacidade de reflectir com a língua absurda, que a apitadela do árbitro aos cento e vinte minutos do jogo com a frança, foi a porta de entrada para o momento mais feliz das suas vidas. E não é apenas um espectador que o diz... Foram muitos, tantos tantos, que fez mossa. Foram centenas, ao longo das longas horas, os testemunhos ouvidos pelos repórters de todos os orgãos de comunicação social, que afirmaram ser aquele o dia mais feliz das suas vidas. Mas será que não têm vida? Ou que as suas vidas são tão insignificantes que uma vitória - importante vitória, diga-se - os preenche como nenhum outro acontecimento até então? Será que nunca viram uma montanha? Um pôr de sol que não se esquece? Nunca foram espectadores de um arco iris incrivelmente desenhado? Nunca experimentaram uma cerveja a estalar num dia de calor? Nunca comeram umas papas de serrabulho extraordinárias? Nunca se restabeleceram de uma doenca que os enfraqueceu? Para já não falar dos filhos que nascem, dos filhos que se salvam, dum redentor beijo de mãe... Que vidas têm sido as deles, e as nossas, que deixamos esqueceidos todos estes momentos, em prol de um outro, que tem com ele a força incrível e desmesurada do colectivo, como aconteceu agora? É isso que mais importa, as coisas que sofremos e gozamos juntos?
O que é certo é que a vida nao acaba nem começa com o europeu de futebol, com a europa ou tão simplesmente com o euro.
Nao basta a Centeno ter posto o cachecol de Portugal aos ombros (onde é que já vai a ideia do pin na lapela?) e ido para a reunião dos manda-chuvas das contabilidades dos países europeus, lembrando a nossa superioridade, que para eles, a cena é a mesma. Paguem e não bufem.
Não acenderem as luzinhas da torre eiffel em homenagem aos vencedores é o menos mau dos castigos. Doi porque se vê.
Já a sansão da europa a Portugal, dói porque se sente.

Não há palavras...