domingo, junho 13, 2010

10 de junho

- Foge cão, que te fazem barão.

- Mas para onde, se me fazem conde...

A historieta é apresentada assim, como uma anedota. Não tem directamente a ver com o 10 de Junho, mas vem a propósito dele. Porque, como então, aquele é um momento em que um conjunto (às vezes) improvável de portugueses é perseguido implacavelmente pela máquina protocolar do Estado, para que lhe sejam pendurados nos pescoços e peitos plebeus, as medalhinhas da praxe.

E sendo assim, há para festejar, com feriado e tudo, imediatamente antes dos foguetes dos santos populares (“Santo António já se acabou”... e o S. João espreita à esquina), das sardinhas assadas, dos pimentos e do manjerico. Antes do povo e das suas festanças, a festa política e burguesa que consagra Camões, Portugal e as Comunidades Portuguesas.

Nunca uma data congregou tantos senidos.

O Estado Novo, como era conhecido o regime politico antes do vinte e cinco de Abril, preferia chamar-lhe o DIA DA RAÇA e nesse gesto, consagrava a capacidade lusa em fazer civilização, versus a incapacidade nativa, africana (por exemplo), para progredir sem a nossa ‘pata’ protectora. O Dia da Raça louvava as extraordinárias qualidades nacionais para resolver o vasto território colonial, produzir organização e, com ela, riquesa, através de um regime politico musculado e autoritário, de onde brotava progresso, civilização e cultura. E assim se construía Portugal. Que era Angola, Moçambique, Cabo Verde, Guiné, Índia e etc, num território que se estendia do Minho a Timor.

Cavaco Silva, há dois anos atrás, distraidamente, numa daquelas investidas menos pensadas, tornou a levantar essa memória, a memoria da raça, referindo-se ao 10 de Junho como o dia (DA RAÇA) que importava comemorar.

Este ano voltou a pôr a pata na poça, passe a expressão.

Não sei o que sepassa, mas por estas alturas de junho, há sempre uma ou outra coisa que o presidente diz, mesmo sem querer, que acaba por o catapultar para as primeiras páginas dos jornais. O desejo que manifestou, de ver os portugueses, pobrezinhos mas honrados, a preterirem o estrangeiro para fazer férias em território português, já buliu com Vieira da Silva, que lembrou que se todos os presidentes dos outros países dissessem o mesmo, e fosem ouvidos pelos cidadãos dos respectivos países, lá se ia o turismo português para o galheiro, que vive dos mercados internacionais, porque como se sabe, os portugueses não têm cheta para gastar. E Cavaco já respondeu ao ministro: se há uma coisa que ele sabe, enquanto professor de economia, é que quantos mais tugas forem lá para fora, para lá da selecção de futebol, mais dinheiro sai do país. Se, pelo contrário, ficarmos aqui, é dinheiro que não sai.

Obrigado presidente, pela lição de economia.

Ainda bem que já cá não está o outro, aquele que depois de hesitar numa multiplicação, nos mandava fazer as contas.