terça-feira, agosto 14, 2007

ainda há pastores

Já Não Há Pastores?, perguntava o filme, logo no genérico, aos muitos espectadores que procuraram lugar na plateia improvisada da esplanada Silva Guimarães, ontem à noite, na Figueira da Foz. O filme encarregar-se-ia de dizer que sim, que ainda há, mesmo que estejam em vias de extinção. E fazia contas connosco, matemática de sobrevivência: que na serra, naquela serra, já houvera dezenas, talvez centenas deles, há uns anos atrás e que, agora haverá uns dez, contas fáceis de fazer pelos dedos das mãos, esquerda e direita, as mesmas que se haveriam de unir no final da exibição, sincopadamente, a palma contra a palma
E depois, o filma arrancou para nos contar a história de um deles, o mais novo deles, Hermínio, trinta anos ou coisa que o valha, um rapazola perdido na serra, entre o destino e o desejo, agarrado ao leitor de cassetes que vomita Quim Barreiros e a um telemóvel providencial que no decorrer das filmagens (quatro ou cinco anos) lhe fora parar às mãos com requintes de Ponte de Encontro.
Trata-se de um filme maior, um documento fantástico, muito bem filmado, melhor montado. Um filme que se desenvolve nos interstícios de quatro ou cinco Invernos e demais estações (o Inverno é mais fantasmagórico, porque se joga no limiar da capacidade de resistência humana), dia após dia, sequências de tempos emborcados pela fita, como os copos de tinto que correram, livres, na goela do jovem pastor, enquanto durou a visualização.
Depois do filme, o realizador, Jorge Pelicano, colocando o dedo na ferida menor que o filme deixa a latejar, diria, em jeito de desejo íntimo: espero que se tenham rido COM o Hermínio, e não DO Hermínio.
Essa seria, sem dúvida, concluo, uma injustiça que o filme, de todo, não merece.
O DVD está à venda nas lojas FNAC.
A não perder.