quarta-feira, junho 27, 2007

Já não ouvia a expressão há muito muito tempo, há muito tempo.
O extraordinário da repetição muito-muito para significar mesmo-muito, terá sido utilizada inúmeras vezes ao longo da história da língua, claro que sim, mas nenhuma terá ficado tão célebre como aquela vez em que José Cid a utilizou numa das suas memoráveis canções:

Há muito muito tempo
era eu uma criança
que te amava ternamente sem saber.


Depois de um hiato enorme, qual cratera à escala de guliver, tornei a ouvi-la, dita com todo o cuidado poltítico, pelo mais alto dignitário português, em terras do Tio Sam. Cavaco Silva, ele mesmo, - o outrora bom aluno europeu e actual presidente da república portuguesa, o que atesta o quão bom aluno ele foi realmente -, quase na casa ao lado da de George Bush, deixou fugir uma lágrima fugitiva em corpo de palavra, e palavra repetida, lamentando que a agenda do presidente americano não tivesse aberto uma pequena brecha para receber o seu homólogo português, que de visita à América, inaugurou uma exposição sobre os descobrimentos lusos, ali mesmo ao lado da Casa Branca. E para deixar escorrer essa pequena lágrima com sentimento político bem medido, lá re-utilizou a expressão a que José Cid deu história, afirmando que, lá está, «há muito muito tempo» que aquela visita estava marcada.
Pareceu chocado o presidente português, embora não o admitisse, com o desaforo buchista que, conhecendo «há muito muito tempo» a agenda do presiente português e tivesse em cima da mesa uma pedido de encontro, não logrou encontrar na agenda cinco minutinhos sequer, para uma curta cavacada com Cavaco.
Ora, isto dói.
Depois admiram-se de Cavaco a pouco e pouco, se estar a transformar num perigoso esquerdista. Mais umas quantas destas, (e não hão-de ser precisas muitas mais), e teremos neste cantinho à beira mar plantado, um novo Fidel da Península.
De Boliqueime à Galiza, a distância é menor do que o que se imagina.

Mas voltando à cantiga. Já estou a imaginar Cavaco, cantando enternecido para um Bush de tranças, na varanda da Casa Branca:

Há muito muito tempo
era eu uma criança
que te amava ternamente sem saber.
Vínhamos da escola
e oferecia-te uma flor
que tu punhas no cabelo a sorrir.
Vem viver a vida amor
que o tempo que passou
não volta, não.
Sonhos que o tempo apagou
mas para nós ficou
esta canção.


Romantismos…