sábado, maio 18, 2013

a palavra de honra


Os miúdos da quarta classe, fedelhos ainda, tiveram, na semana passada, uma experiência inolvidável, uma coisa para mais tarde recordar. Na verdade, nem foi uma, não. Foram duas. Duas experiências. Por duas vezes, os meninos subiram para as mesmíssimas camionetas, e ao som do ‘oh senhor condutor ponha o pé no acelerador’’ cumpriram a via sacra festiva do caminho das salas de exame longínquas e, por duas vezes, foram obrigados a assinar um documento onde garantiam pela sua honra, que não usavam auxiliares electrónicos - creio que telemóveis, ou lá o que quer que fosse - na feitura das provas.
Os putos, que já estavam nervosos, com a honra de putos em risco, pior devem ter ficado.
A questão, como muito bem disseram as associações de pais e os professores mais atentos, não estava na jura pela honra, mas nela própria, na honra, ainda por cima num país de desonrados, a começar pelo próprio ministro.
Peco desculpa se estou a ofender alguém, mormente o senhor ministro, mas quem prometeu aos professores - e falo dos professores em concreto, por conhecer mais ou menos bem essa… narrativa - o que o ministro Crato prometeu, para imediatamente a seguir, desdizer, quebrar a promessa, faltar ao prometido, vir agora falar de honra, ainda por cima a miúdos de nove anos, é a cereja no topo do bolo da parvoíce.
Este pais é uma anedota, pronto. O que é que e há-de fazer? É a nossa sina, sejam os ministros feitos de matéria sociológica, económica, artística ou matemática.
Percebo pouco, ou nada, de pedagogia infantil, concedo. Do exame da quarta classe, que fiz, (creio que apenas um... ), lembro que íamos à escola maior e, pronto, estava a coisa feita, o Conde Ferreira no meu caso, mas posso estar errado que a memória é coisa que está a desaparecer em mim, como o cabelo no meu caso e, já agora, a honra no ministro. A gente sabia que não podia copiar, que era proibido, e para isso lá estavam de plantão os professores passeando por entre as carteiras em fila, carteiras que, creio, nos albergavam aos pares, para que sentíssemos a tentação mas não tocássemos a maçã. Levávamos a nossa melhor roupa, nem dormíamos nessa noite e, eu em particular, levava uma caneta de tinha permanente, coisa nova nas minhas mãos, prenda antecipada, que me fazia sair da prova com os dedos todos enporcalhados da tinta preta vertida, mas orgulhosos, os dedos e eu, da prova realizada. Não me lembro de ter sido obrigado a assinar o que quer que fosse, para lá do cabeçalho das provas, em letra bem legível, redondinha, como a D. Teresa Ramos denodadamente me ensinou nos cadernos de duas linhas e como pouco tempo antes ensinara o meu pai a fazer, que quase fomos contemporâneos na escola primária que frequentámos, o Externato Infante Santo, na Figueira da Foz.
Sem juras, mas com a honra de puto imaculada, porque a honra é uma coisa de consciência e, sem ela ou com ela alterada, fora da norma, seja lá a norma o que que que seja, não há falta. É a história do livre arbítrio, mas ao contrário.
Do mesmo não se pode gabar o ministro Crato no que às promessas aos professores diz respeito.
Na honra não há propriedade comutativa. Não podemos a nosso bel-prazer, alterar a ordem dos factores.
O que é, é.