quinta-feira, março 26, 2009

Dia Mundial do Teatro – 2

Ligaram-me de um jornal, no caso do JN, para que depusesse sobre a condição de actor, a propósito do dia Mundial do Teatro, que amanhã se comemora. Depois de pensar um pouco, lá me atrevi a dizer meia dúzia de coisas básicas, infelizmente coisa muito pouco festiva.
Depois de algumas horas de intervalo, entendi verter essa reflexão para aqui, local de partilha dos meus meia dúzia de pensamentos com um mínimo de articulação.
Acho – e é sempre bonito começar qualquer pensamento com esta expressão, porque ela enuncia um pensamento, o nosso, e por trás dele, o que o pensa, ou seja, o pensador ele próprio, isto é, eu – que as coisas estão demasiado negras. Mas isto, mal dito assim, não é mais que chover no molhado, verter amargas lágrimas no azedo choradinho nacional. Concretizemos, pois: não sei, com rigor, o que é ser-se actor, hoje em dia, em Portugal. Há uns tempos atrás, eu sabia, juro pela minha saúde. Quer dizer, conhecia as regras, os caminhos para se chegar lá. Quando pensei em ser actor, conversei com algumas pessoas ligadas ao meio e quase todos me disseram o mesmo. Quero com isto dizer que se conheciam as regras, estavam abertas as estradas, sinalizados os caminhos. Não que tudo fosse perfeito, longe disso, mas estava tudo mais ou menos clarificado. Fazia-se a formação profissional em locais credenciados, (ou vinha-se de sítios onde a prática teatral era uma realidade mais ou menos cumprida, como o teatro de amadores, por exemplo), depois fazia-se o estágio numa estrutura de produção (dito de outra maneira, num Companhia profissional) e, terminado esse período (já não lembro se um ano, se dois), obtinha-se a ambicionada carteira profissional. Porque nem sempre as coisas correram bem na relação entre os sindicatos e o ministério do trabalho, às vezes era o sindicato a aprovar a entrada na classe, e pronto, valia o cartão do sindicato. Com a carteira profissional, ou com o cartão do sindicato, obtinha-se trabalho. Ou não, que o desemprego sempre foi uma constante na classe. Hoje, francamente, não sei como é. É-se actor depois de não se saber muito bem o quê. É-se actor, muitas vezes, contra os jovens que fazem a sua formação nas escolas credenciadas (três anos ou cinco, no ensino superior, via Bolonha), se bem que outras proliferem, concretamente no ensino dito particular, igualmente acreditadas, mas que desconfio que servem para tudo menos para fazer formação. Existem porque razões de mercado as impuseram, diz-se. Pronto! Funcionam como porta de acesso a umas quantas experiências, normalmente televisivas, et voilà. Valoriza-se determinada imagem, a que se reconhece em gente que tem «passado» nas passareles (com todo o respeito que tenho pelas pessoas que fazem vida disso…) ou uma imagem iluminada por essas tendências, que se saiba insinuar de um modo formatado e de acordo com os padrões em voga neste ou naquele momento. Depois de uns minutos de fama nas televisões e nas novelas terceiro-mundistas que por cá se fazem – e por lá, situe-se este lá onde quer que seja – e está-se pronto a subir ao palco e a ser-se chamariz das massas, mesmo que não se saiba dizer duas palavras seguidas. O grau de exigência eclipsou-se, tudo serve, o que vem à rede è peixe. Ok!