terça-feira, novembro 28, 2006

suspiros ibéricos

«De Espanha, nem bom vento nem bom casamento», diz o povo, não sei se com razão ou sem ela.
Isto é o que dizemos. Imagino que os espanhóis tenham um ditado mais ou menos semelhante a este, só que com sentido contrário, isto é, relativo a nós.
O que é facto é que temos para com nuestros hermanos, uma relação mal resolvida, de centenas de anos e muitos conflitos. Imaginamos que somos o apetecido pedaço que lhes falta, construídos num punhado de terra que já lhes pertenceu, que à vista desarmada complementa a sua terra, herdeiros mais poderosos de uma ideia-pojecto de Ibéria. Somos o pedaço de praia que lhes foi sacado na comunicação com o atlântico, cunha anti-natura que os separa do mar há novecentos anos. Somos uma espécie de país que fala uma língua semelhante à deles, porventura construída paredes meias com a que eles falam, ou a que eles falavam no tempo de D. Dinis, que é quando a nossa foi fixada, grafada, agarrada ao papel com o cimento-cuspo da história.
Muitos de nós, desiludidos com a condição de sermos um pequeno país ancorado entre um mar que não sabemos utilizar e uma terra que se fez muito maior e mais próspera que a nossa, sonhamos com uma unificação política qualquer, que nos ofereça (devolva, na sua opinião) a qualidade de vida que ambicionamos, e que esta portugalidade nunca nos poderá ofertar.
De vez em quando, há uma centelha de esperança que perpassa de um discurso, de uma ideia. O iberísmo está presente em cada esquina do nosso desconforto, e muitas vezes chega de onde menos se espera.
Desta vez, diz a queixa entrada na Procuradoria-geral, vem pela voz de um ministro da república portuguesa, no caso das Obras Públicas, Mário Lino, que em Abril, em Santiago de Compostela, ousou afirma a Ibéria, não já como projecto político, mas como uma nova realidade. Ora, dizem os queixosos, entre os quais um tenente-coronel reformado da Força Aérea chamado João Brandão Ferreira, tal afirmação «ofende e põe em perigo a independência de Portugal».
A queixa, assinada por doze subscritores que, tal como o nome já citado, é constituída maioritariamente por oficiais reformados, pode levar o ministro a cumprir, sendo condenado em tribunal, uma pena de prisão entre os 10 e os 20 anos, por crime de traição à pátria, de acordo com o código penal.
Li isto num artigo do jornal Público dum destes domingos, e não pude deixar de sorrir. Para o bem e para o mal, o iberismo está aí, a prestações. Primeiro foi a banca (primeiro?), a seguir os transportes ferroviários (tê gê vê), e depois logo se verá. Por muito que isso custe a oficiais reformados, feridos na sua masculinidade lusitana, seja qual for a sua arma.

nota: D. Duarte Pio tomou a palavra e, na capa de um dos jornais sensacionalistas quepor cá se fazem, afirma que é preciso «combater o iberismo». Mais uma voz na cruzada contra o irmão mais inimigo que temos.