terça-feira, novembro 07, 2006

a força do rio

Os últimos acontecimentos no Teatro Rivoli, no Porto, mesmo não sendo coisa nova no panorama internacional (e mesmo nacional), nem por isso era coisa previsível, e decorrem do aluimento dos caminhos possíveis dos agentes culturais, do defenestramento do espaço de discussão e participação cívica, e da escassez de soluções de sobrevivência de tantos desses agentes, que resultam do abandono do Estado daquilo que deveria ser uma das suas primordiais incumbências. Creio que esses direitos estão mesmo explícitos na Constituição que os diferentes poderes juraram observar e cumprir. Ao alhear-se, por exemplo, da administração dos equipamentos culturais que tutela ou que deveria tutelar, a autarquia do porto demite-se da sua obrigação e atira para trás das costas, responsabilidades que não pode, de forma nenhuma, alijar.
Sem espaço onde mostrar os espectáculos que vai produzindo, e sem expectativas na luta contra a massificação do gosto – que é a pior das ditaduras - aos agentes fabricadores deste artesanato, entre os quais me incluo, não resta outra alternativa senão, cheios de um orgulho reprimido, partir para acções mais dramáticas, menos bem compreendidas pela generalidade dos cidadãos, arredados como estão da informação correctamente articulada e, por isso treslidas, suas causas e razões.
Não querendo ficar por aqui, Rui Rio, determinou levar ainda mais diante a sua política cultural: decidiu acabar com a política de subsídios. A partir de agora, da autarquia do porto não se podem esperar apoios financeiros para o que quer que seja, desde que vagamente cheire a opinião e cultura. Nada que, na prática, já não acontecesse. Quantos grupos de teatro, por exemplo, foram apoiados financeiramente pela autarquia nestes últimos dois anos? E quantos não sentiram a forte tenaz ruirienta a atentar contra a sua sobrevivência e projecto?
É caso para perguntar:
Não será tempo do estado central acabar com o subsídio à câmara do Porto e passe a apoiar, ele próprio, e directamente, os cidadãos ou os grupos animados por eles, nas actividades ditas culturais que, contra a vontade autárquica, ainda vão acontecendo? Afinal de contas, para que é que serve uma autarquia, se ela se afasta dos cidadãos (que pelos menos alguns são) que deveria proteger, estimular e apoiar? Se não serve para isso, que se acabe com ela. O desperdício, na óptica da autarquia visada, começa aí.