domingo, outubro 23, 2005

Notas de Viagem VIII


A Fontana di Trevi é, talvez, um dos locais mais visitados de Roma. Claro que há o cinema a dar-lhe charme; claro que há a majestade da fonte; claro que há as tantas razões para que os passos dos turistas acabem por desenhar o caminho daquela água.
Na Fontana di Trevi, não são apenas as águas agitadas que caem no alto do conjunto escultórico; são igualmente os euros e as tantas outras moedas, que levam à boleia de si, os segredos que não podem ser revelados, dos desejos que, secretamente, se desejam, antes que o braço repita o caminho celebrizado por David.
Por uma espécie de labirinto férreo que desenha no chão da praça, um caminho de sentido único para todos os que querem aproximar-se das águas, a Fontana oferece-se como alvo e, diz-se, distribui todas as noites a sua riqueza por quem necessita dela, ou seja, por instituições de solidariedade. Não sei se é vero. Parece que as águas, durante o ciclo das vinte e quatro horas, apenas param de jorrar durante sessenta minutos, de noite, momento para recolher o cacau e limpar a área.
Quando lá fui, uma velha senhora nipónica, com menos poder de locomoção, resolveu, de muito longe (ainda o caminho da água começava a desenhar-se na pequena praça), arremessar a moedinha da praxe com toda a força que tinha. Apesar do investimento muscular feito e da pouca distância a vencer, o gesto acabaria por revelar-se insuficiente. A moeda percorreu com dificuldade uns poucos de metros pelo ar, cai não cai, mas lá se foi aguentando, até que, sem mais propulsão, desfaleceu sem retorno, embatendo na cabeça de uma outra senhora (japonesa ou coisa assim… o difícil era não acertar num turista com essa proveniência), que ficou a esfregar o local de embate, sem saber o que lhe tinha acontecido.
Das duas uma, deverá ter pensado: ou o desejo pensado é coisa que não se realizará; ou coisas daquelas não se desejam. E se assim foi, corou. Mas isso, eu já não vi.