terça-feira, outubro 11, 2005

Notas de Viagem III

Eu já sabia que, oficiosamente, o sinal vermelho dos semáforos nas estradas portuguesas significava, sobretudo à noite, ter atenção à polícia, olhar atentamente à volta e passar de mansinho; que o amarelo significava «acelerar»; e que o verde queria dizer «andar à vontade, na maior».
O que eu não sabia era que tudo isto ganhava um sentido diferente em Roma. Um sentido amplificador, diria. Não há passadeira que resista, quer tenha peões ou não; não há cruzamento que determine prioridades. A palavra de ordem é avançar sem medo.
(…)

São milhares os carros que circulam descontroladamente nas estradas do centro de Roma. São, igualmente, milhares os turistas e habitantes que circulam a pé, e que se digladiam, sem tréguas, no ringue mais perigoso que conheço: a estrada.
Aos peões põe-se um dilema difícil de resolver: se não avançarem resolutamente, nunca passarão; mas se derem o indispensável passo em frente, correm o risco de ser atropeladas. Contudo, essa é a única possibilidade de passar para o outro passeio e continuar caminho.
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A convivência do peão com a máquina (carro ou moto) é muito difícil no centro de Roma. Basta pensar nestes números: Roma terá, talvez, cerca de cinco milhões de habitantes. Se a estes moradores habituais, se juntarem uns três ou quatro milhões de turistas, as contas tornam-se completamente impossíveis.
Para complicar ainda mais a equação, a própria organização do trânsito é caótica. Motas e carros lutam por uma trajectória, por um pedaço de alcatrão livre. Roma vive em permanente estado de «hora de ponta».
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Por isso, também, a poluição é extraordinariamente intensa, quiçá na proporção directa da inexistência de espaços verdes. É verdade que alguns terraços denunciam a presença de jardins «suspensos», porventura belos, e privados, mas insuficientes para restabelecer algum equilíbrio na qualidade do ar que se respira. Também é verdade que, onde quer que tentassem construir um jardim, com grande probabilidade, encontrariam vestígios romanos. Há, portanto, pedra, em vez de árvores.
(…)
Depois de uns dias passados na cidade eterna (segundo Mega Ferreira, esse epíteto resulta do facto de ser Roma a cidade com mais obeliscos alevantados… ora, sabe-se, o obelisco é símbolo de eternidade…), regressar a casa é já um pequeno milagre que, felizmente, acontece com frequência.
E que melhor designação poderia haver para a palavra «milagre» senão os sucessivos regressos de tantos turistas?