quarta-feira, dezembro 12, 2007

o ciúme

O ciúme é um sentimento muito lindo, muito são, digam lá o que disserem, que fica bem a qualquer pessoa bem formada, que tenha o sentimento no sítio. Convenhamos que, sem ciúme, qualquer relação, perde o sal que a deve temperar. Sem ciúme, qualquer relacionamento amoroso, por mais genuíno e profundo que seja, se releva imediatamente como coisa superficial, de desprezar, descartável, coisa de deitar fora sem que fique grande peso na consciência.
Eu defendo o ciúme como condimento essencial ao fortalecimento de qualquer relação. Para aqueles que me vêm com a cantiga de que o ciúme é uma degenerescência, eu rio e afasto-me de quem emite tal opinião, que para mim é um verdadeiro atentado ao bom senso, e à experiênciação do amor total-total.
O ciúme é importante, fundamental, até para que se possa fazer a aferição do sentimento maior, que é o (uff, lá vem o romantismo) amor. Quem não sentir ciúme – e digo-o porque acredito profundamente nisso – é porque não ama suficientemente.
E digam lá que não são desejadas as cenas de ciúme? Onde está o amante que não deseje que o seu parceiro tenha, de vez em quando, e já agora – condescendo – na medida certa, um acessozinho de ciúmes? Daqueles que entusiasmam!… Que estimulam!... Não há. Por mais puristas que alguns se digam ser, ninguém resiste ao encanto do ciúme.
E o ciúme é gajo para atacar em todas as idades. Na puberdade: naquelas relações inocentes que todos experimentámos; na adolescência e na juventude: onde as coisas são na exacta medida da importância que supomos que elas têm e, nessas idades, como se sabe, elas têm toda a importância do mundo; na maturidade: onde já somos capazes de relativizar quase todas as coisas; e na velhice: onde tornamos às coisas importantes e somos capazes de matar para manter a paixão que julgamos ser a última das nossas vidas.
Vem isto a propósito de uma querela entre idosos num lar da terceira idade em Paredes de Coura, salvo erro. Segundo o administrador do lar, uma velhinha de relação estreita com um velhinho, começou a ser assediada por um outro velhinho. O primeiro velhinho, o que tinha por garantida aquela relação, vendo-a perigar – a velhinha também devia andar a dar muitas abébias, (afinal de contas de que valeria um assédio se ninguém o soubesse» não é?), entusiasmada com o assédio, deve ter dado baldas em demasia – atraiu o pretendente a um descampado e, disse-o assim, tal como num filme do Jonh Wayne, agarrou num punhado de terra e atirou-a aos olhos do antagonista. O assediador ficou sem ver nada e o primeiro, com a ajuda de um varapau, arreou forte e feio. O senhor foi internado no hospital com nódoas negras variadas, e a velhinha deve ter retornado, feliz, ao remanso do lar, pelo duelo que ainda foi capaz de promover. O casalinho retornou ao seu namoro, certamente mais aquecido que nunca, e o assediador teve, no hospital, espaço e tempo para travar amizade com enfermeiras variadas (muito mais jovens) e com as velhotas internadas. Umas e outras devem ter ficado excitadíssimas na presença de criatura capaz de tamanho feito. Afinal de contas, um D. Juan é um D. Juan, quer se tenha vinte quer se tenha 70 anos.