terça-feira, setembro 28, 2010

do futebol

O futebol é um jogo formidável.

Escreve-se com os pés, entre outras partes do corpo, mas pensa-se com a cabeça. E há jogadores que são capazes de fazer da sua boa prática, uma espécie de arte, fazendo com a bola, esse objecto caprichoso, as coisas mais fantásticas.

Mas à volta deste jogo, que aparentemente é coisa simples, acotovelam-se interesses imensos que, a pouco e pouco, estão a minar o entusiasmo dos adeptos e a confiança na boa-fe dos jogadores, sejam eles os que dentro do campo espalham a magia, sejam os que arquitectam as estratégicas politicas das agremiações a que presidem, ou outras estruturas.

Às vezes, sabe-se lá porquê, a caprichosa bola iniste em não cumprir o seu destino último e que é de entrar nas balizas que delimitam o campo de jogo. Às vezes percebem-se as razões. A desinspiração é a razão maior para os falhanços; outras vezes é a incapacidade técnica dos artistas, que o são de menos; e por último, mas não por fim, o azar é outro dos condicionalismos a levar em conta.

Não sei se pela primeira se pela segunda se pela terceira razão, ou se por alguma outra, a selecção nacional, está a passar as passas do allgarve. Joga e não ganha, ainda por cima joga mal, e para cúmulo, o seu treinador é suspenso pela entidade patronal por ter faltado ao respeito da mãe de um funcionário público, no exercício das suas obrigações.

Para resolver o gravíssimo problema, despediram o treinador e pensaram na contratação de José Mourinho, que é assim a modos que, para a selecção, uma espécie de D. Sebastião de chuteiras e apito na boca.

O rei desejado dizia que sim, que até vinha de borla, nem a gasolina lhe precisavam de pagar, mas o patrão espanhol é que não foi na cantiga e, como diz a cantiga, no canto do não, dobrou.

E ainda bem, digo eu.

Era completamente terceiro-mundista a solução de um treinador residente em Espanha, a ganhar a sua vida lá, e nas horas vagas, a treinar a selecção portuguesa de futebol pelo skipe.

Já só faltava isto para pôr o mundo a rir ainda mais de nós.

Parece que com a nega recebida de Espanha, Portugal se virou para um nativo (o que é bom) que estava desempregado há cerca e um ano. Pelo menos poupa-se um subsídio no fundo de desemprego, e baixa-se o número de desempregados.

Boa solução.

domingo, setembro 19, 2010

de uma maneira e de outra

O estado português, não sei se bem ou se mal, decidiu criar mega estruturas escolares, inventou uma empresa para transformar as velhas instalações em espaços praticamente novos, aparentemente criou condições excepcionais para o ensino. Para tanto, sacrificou pequenas unidade de educação, aquelas que tinham menos alunos, menos do que um mínimo que estabeleceu sabe-se lá com que critérios (que os haverá, quero acreditar), mormente no ensino básico, obrigando os pequenos estudantes a fazer viagens, umas mais longas outras mais curtas, entre as povoações onde está sediado o agregado familiar de onde provêm, e a nova mega-escola que passarão a frequentar.

Esta politica e planificação educacional, acarreta questões que provavelmente não terão sido devidamente discutidas, deixa dúvidas aos pais e, mesmo, aos professores e demais parceiros no processo educativo, autarcas incluídos. Se é certo que, congregando meios, se melhoram as condições materiais das escolas, por outro lado, afastando as crianças dos ambientes que conhecem, em idades de tão grande fragilidade, física e emocional, obrigado-os a esforços que muitas vezes vão para lá da sua capacidade, colocam em causa a eficácia da recolha dos conhecimentos de que se querem possuidores. E, sobretudo, digo eu, fragilizam ainda mais as crianças

Em contrapartida, é curioso pensar que, em casos não exactamente semelhantes mas parecidos, o mesmo estado procede de forma oposta. Estou a lembrar-me da revolução operada num mega estabelecimento de ensino que o estado português tutela, e onde, depois de conhecidas as tremendas e criminosas condições de protecção dos alunos, determinou agir exacamente em sentido contrário. Na Casa Pia, que é o estabelecimento a que me refiro, que se sabia ser uma instituição de descomunais dimensões, o estado faz de maneira oposta: dividiu a grande estrutura em pequenas células, de modo a possibilitar uma mais eficaz protecção e integração equilibrada das crianças no grupo, a partir de um espaço mais íntimo onde elas aparentemente estão mais defendidas, procedendo de modo a que elas sejam retiradas de um mundo sem rosto, a fornecendo-lhes o conforto da família possível.

Num sítio é assim; no outro é assado.

Qual das duas politicas é a correcta?

Tão importante é essa questão, como a experiência agora defendida. O que me inquieta é o défice aparente de reflexão, de pensamento, de doutrina.

O futuro dir-nos-à o que é mais certo.

Esperemos que sem remorsos nem arrependimento, como tantas vezes acontece.

sábado, setembro 11, 2010

justiças

Finalmente, e isto é uma força de expressão, o chamado processo ‘Casa Pia’ chegou à sentença. Oito anos depois de se ter inicado o julgamento, novecentas testemunhas depois, a sentença foi lida, mesmo que apenas em súmula muito resumida.

O meu feeling, a propósito da inocência ou culpa dos sentenciados, não é para aqui chamada. O processo foi tão intrincado, tão confuso, tão tortuoso, de tanto melindre, que permite as mais díspares opiniões, que acreditemos nesta e naquela verdade, estarmos deste ou daquele lado. No momento da leitura o resumo, aliás, à medida que ia ouvindo as diferentes intervenções, e depois de conhecida a sentença, a minha opinião ia mudando, assumindo solidariedade com este e com aquele, conforme cada um gritava a sua inocência, nas televisões todas.

Mas esta volatilidade não é para aqui chamada. Quero reflectir, se me permitem, sobre outro aspecto do caso, que ficou mais patente nas varias intervenções.

Disseram muitos que, depois de oito anos de julgamento, e sabendo das capacidades e manhas dos advogados capazes dos jogos mais cinzentos e subterrâneos, e que este seria sempre apenas o primeiro de vários assaltos, e com a certeza dos vários recursos interpostos, corria-se o sério risco de os ver prescrever. Quer dizer, e pondo as coisas no presente, corre-se o risco de deixar estabelecer, entre os crimes ocorridos e a data de deliberação final, um prazo maior que o máximo determinado pela lei.

E a possibilidade de prescrição de crimes em abstrato, pode ocorrer relativamente a todos os crimes. Creio, informei-me sobre isso, que apenas estão fora desta baliza, os crimes de genocídio.

À partida, e sem ser matéria que me ocupe muitas horas, faz sentido que se pense na possibilidade de revogar esta lei.

Sobretudo num pais onde se sabe que os mais poderosos podem fazer arrastar os processos pelo tempo que melhor lhes apetecer.

A lei não deve ser cega, ainda que a justiça sim.

Mas a justiça portuguesa está mais doente que a tesouraria do Hospital de S. Marcos.

quarta-feira, setembro 01, 2010

o elogio do não-produto

Este Setembro chega cheio de calor, a lembrar o Agosto que já se foi, as férias que, na sua esmagadora maioria, já foram cumpridas, e sabe Deus com que trabalho, que o povo, sabendo das dificuldades que o país atravessa, o que queria mesmo era continuar a labuta, isto para quem labuta, que para os portugueses desempregados – já não falando dos mal empregados – as férias foram coisa que não houve, que a seguir ao desemprego vem sempre o desemprego, excepção feita a alguns que souberam estar na hora e no local certo, ou foram avisados para estar ali àquela hora, ou tiveram a quem recorrer, a chamada discriminação positiva em que somos tão bons, e agora engrossam o grupo dos que recebem pelo trabalho que fazem, (ainda que poucas vezes o salário – em Portugal – coorresponda ao que se produz. Que ainda por cima, é pouco, poucochinho).

Aliás, pelo que vou percebendo, por aqui produz-me quase nada.

Somos mais assim do género do chico-esperto que faz de conta que produz, até parece produzir, mas na volta, nada.

Se não, oiçam esta história.

Um tipo, (português, pois está claro), sei lá porquê, gosta de se barbear com lâmina e, por isso, precisa de, antecipadamente, amaciar a cara com espuma. Por razões que desconheço, o homem gosta de uma espuma especial que apenas é fabricada na América. Não existe em mais nenhum sítio do mundo. Só na América. Aqui, portanto, onde o homem vive, também não há. Bom, aparentemente, eis aqui um conflito. O homem quer uma coisa que não há cá. Que tem de vir de fora. Mas se é só ele a precisar... Então, o que é que o português pensou - como bom chico-eserto que é? Fez reverter uma situação, que lhe era desfavorável, numa outra onde pôde até, para lá de resolver o seu problema, fazer lucro. Pensou: deve haver mais gente como eu, a precisar de coisas que não existem aqui, aqui ou no sítio onde as pessoas estão (e com este simples pensamento alargou todo uma geografia de nogócio), ou que existem de uma forma muito selectiva. Então, criou uma empresa na net, que é onde agora as coisas acontecem, capaz de satisfazer estes pequenos caprichos, e está a resolver or problemas especias de uma data de gente (portugueses e não só) que, de uma maneira selectiva, estão a precisar muito de um produto que apenas é produzido num sítio qualquer esquisito no mundo. No caso, e só para desmistificar esta equação, o tipo usa as pessoas que viajam mundo fora para resolver o problema. Com esta invenção, o chico-esperto português, agora, ganha dinheiro com estas frek-necessidades. É u herói. Mas produziu alguma coisa? Nada. Zero. Nicles.

Deve ser do calor. Estamos a tornar-nos gente incapaz de produzir o que quer que seja. Exepção feita a um punhado de portugueses que continua a saga de fazer o que quase toda a gente acha que é desnecessário. Porque é que nos havemos de cansar a produzir o que quer que seja, se podemos comprar tudo ao estrangeiro e, na esmagadora maioria das vezes, mais barato até do que produziríamos?

Estamos a especializar-nos em matérias tão questionáveis como a dos criadores de necessidades. Somos intermediários. Mas não no espaço de interferência directa com o produto. Não. Na cadeia das coisas paralelas. Nem vemos o produto. Como – lá está - a criação da necessidade. O terceiro, (o terceiro incluído, como na filosofia), é tocado pela necessidade que lhe foi injectada na libido consumista, e procura o produto. Precisa desesperadamente dele. Não sabe para quê, mas precisa. E, raios, o produto não é produzido cá. Isso é que era bom. É importado. Que isso é que importa. O que importa é a margem de lucro. E é nisto que nos estamos a trasformar. Especialistas da não produção. Especialistas no não-produto. Especialistas na desespecialização.

Bem feito.