sexta-feira, julho 30, 2010

adeus, antónio

quinta-feira, julho 29, 2010

salazar

Salazar, o português que os portugueses – num concurso televisivo - quiseram que fosse o maior de todos os tempos, morreu fez terça-feira quarenta anos. O homem e o estadista a quem António Ferro – uma espécie de Goebels do Estado Novo português - construíu uma imagem que ainda hoje perdura no imaginário nacional, (tão sólida, tão credível, tão reconfortante), mesmo com todas as histórias entretanto recolhidas e consabidamente confirmadas, histórias que contrariam tantas das ideias que dele fizémos (quem fez…), imagens eivadas de esplendor patriótico, de sabastianismo serôdio, perdura – apesar de tudo - no nosso imaginário. O trabalhador incansável da nação, o grande líder, o Salvador da pátria, aquele que nos livrou da guerra, o obreiro maior da portugalidade, o poupador da fazenda pública, o homem que deixou os cofres do estado cheios de ouro, o que casou com a pátria, o que se absteve (que se sacrificou, mesmo) de uma vida familiar comum, o trabalhador solitário, inquebrantável no desejo de engrandecer Portugal, o incorruptível, o homem de gostos simples, ainda é a imagem que guardamos de Salazar quando pensamos nele. O homem que, apesar das origens humildes, soube alcandorar-se aos lugares cimeiros da nação. Uma espécie de conto de fadas, mas em versão política, que mantém acesa uma luzinha de esperança a todos os de condição humilde, como ele… E é incrível como, apesar do tanto que entretanto soubemos dele, das suas misérias e dos seus fracassos, ainda haja quem suspire pelo seu regresso, não dele exactamente mas de alguém parecido com ele. Por cada fracasso de Sócrates, um suspiro saúdoso. Por cada calinada cavacal - um homem que se assemelha com ele, em tanto – um desejo irreprimível.

Antes de Kennedy ensinar aos americanos que, a pergunta certa era, não o que a pátria podia fazer por eles, mas o que eles podiam fazer pela pátria, já Salazar em Portugal – sem espaço para perguntas – respondia por todos, defendendo que, aqui, neste cantinho, não se questionava a pátria, não se questionava Deus e a família, os três baluartes que suportavam a política salazarenta. Traduzido em bom português, em português saloio, era o tempo dos três éfes: Fado, Futebol e Fátima. Um país onde o vinho dava de comer a não sei quantos milhões de portugueses, dito assim mesmo nos cartazes da propaganda.

‘Deus Pátria e Famiília’, uma frase que Salazar terá descoberto no colégio em Viseu para onde foi, em estado de professor, contratado em início de carreira. Uma frase bordada num estandarte de seda, de autor brasileiro, a que se juntava uma quarta palavra: Liberdade. Salazar guardou, para o seu discurso politico, três das quatro palavras, e percebemos porquê.

Fez terça-feira quarenta anos que morreu.

Seriamos um país diferente, se em vez de quarenta, tivessemos celebrado oitenta?

quarta-feira, julho 28, 2010

funchalices 7

As ribeiras que em fevereiro de 2010 sofreram rombos violentíssimos, com a água caída em precipitação violenta, mas também – e principalmente – com o arrastamento dos detritos, pedras e demais volumes, são as mesmas ribeiras que hoje dão trabalho e dão a ganhar a uns quantos empresários que nela depositaram máquinas e aparelhagens, os maiores e, porventura, os mais disparatados lucros. As pedras que vieram (parecia que empurradas pelo diabo), já foram extraídas e usadas sabe-se lá em que obras, que deram dinheiro e geraram riqueza a umas quantas empresas.

O professor Domingos Rodrigues, de Braga, foi protagonista das histórias trágicas que da Madeira nos chegaram aquando das enxurradas. Desdobrou-se contactos com a imprensa, mais no afã de salvar gente, que na urgência de encontrar respostas. A tragédia, aliás, estava anunciada por ele, há mais de dois anos. Ele ensinou-nos o cuidado a ter em situação de catástrofe.

http://www.youtube.com/watch?v=xdVx3iuRTp8

Já não estava com ele há vinte anos. (Não conta termo-nos cruzado num comboio continental, numa viagem porto-lisboa). Procurei-o agora. Andava a medir pedras que foram arrastadas pela violência das águas, com jovens alunos um pouco de todo o país, voluntários, na tentativa de perceber. Para prever.

(...)

Três ribeiras (as que eu vi), três leitos violentados e (tan-tan-tan-tan) três empresas a lucrar. No Funchal, como em Braga. Nesta ou naquela matéria. Alberto João e Mesquita Machado: dois partidos, duas regiões, mas o mesmo instinto, a mesma visão da coisa pública, o mesmo sentido de política, a mesma oportunidade.

Mas não me ponham na pena o que não escrevo. Porque não ouso, porque não sei.

funchalices 6

Por aqui, sobe-se muito e desce-se outro tanto. Uma montanha russa com sotaque e chapeuzinho típico na cabeça, mas muito menos que na caricatura que dela sabemos existir. Que o deve haver, ao sotaque, cerrado e risível, mas menos aqui, ou menos audível aqui na cidade grande.

Mas façamos lição: a ilha maior do arquipélago da Madeira tem cerca de 250 mil habitantes e deles, 120 mil só aqui, no Funchal. E se há gente que, vencida pela interioridade, não sabe ainda o que seja essa coisa líquida e azul chamada mar (tão perto mas tão longe), também há gente que não sabe o que é o viver no interior, numa ruralidade e pobreza inacreditável onde só se chega em estado de comício, paredes meias com uma eleição qualquer.

E se a ilha tem cerca de 50 quilómetros de extensão máxima, precisava de mais de três horas de viagem para os percorrer. A tradução do quilómetro em tempo de viagem obedecia a uma regra de tempos de antanho que urgia corrigir. E foi isso que foi feito.

Agora, as pessoas, tal como as águas, andam encanadas. Para não se subir tanto e descer tanto, alberto joão pôs-se a cavar túneis na ilha. Agora anda-se debaixo da terra e uma viagem que demorava três horas, demora agora trinta minutos.

Tal qual as águas das ribeiras. A partir de determinado sítio ou lugar, que para elas significa a partir de determinado momento da sua viagem, as águas são domesticadas, encanadas, correm com margens de pedra, feras amansadas temporariamente, como as enxurradas de fevereiro deste ano demonstram cabalmente. São águas em estado transitório de mansidão. Como os animais enjaulados e treinados para fazer malabarismos que os violentam. Um dia hão-de rebelar-se contra o tratador e a mão que empunha o chicote mas que é a mesma que lhes dá de comer. essa mão será arrancada com um só movimento mandibular.

São cruéis os animais? Ou apenas obedecem à sua natureza?

funchalices 5

Esfreguei os olhos. No meio de nada, ou no meio de tudo, depois de quilómetros percorridos encanado (esta historieta já a conto), o sol abre-se de repente e no meio da edificação que apenas se adivinha, um Botero. Enorme. No meio de um páteo extraordinariamente desenhado, do Centro das Artes Casa das Mudas, um torso Boteroano.

E a seguir (ou antes...) a edificação. As linhas perfeitas, a arquitectura mágica. É uma espécie de fórmula um na paisagem agreste da Calheta, na zona oeste (?) da ilha. Um fórmula um a que falta gasolina, dizem-me. Mas neste país improvável, onde é que não falta gasolina? Não estamos nós habituados a empurrar o carro, ribanceira acima, na esperança e encontrar uma descida salavadora?

Ora vejam estas imagens.

http://www.centrodasartes.com/Galeria_de_imagens-242.aspx

terça-feira, julho 27, 2010

funchalices 4

Veleiros povoam a paisagem. Não lhes sei os tamanhos, apenas lhes posso adivinhar o arcaboiço. Andam de um lado para o outro, ou nem isso. Serão talvez, outros os barcos que eu vejo passar da esquerda para a direita, desiguais àqueles que antes vira navegar da direita para a esquerda. Vejo-os distantes e próximos, não os mesmos, mas outros-mesmos.

Os turistas veteranos, holandeses-espanhóis-alemãos-e-outros vão abandonando os seus quartos e encaminham-se para a piscina, paredes meias com os aposentos, e a meio caminho do mar.

O sol esconde-se por trás desta nebelina quente.

Há mais gente que vem à varanda espreitar, tomar o pequeno-almoço, responder ya a quem pergunta alguma coisa de dentro e fumar cigarros sobre cigarros. Ainda não é uma revolução, mas é um começo.

Ontem à noite havia fado. Não perceberam o que fosse (ou perceberam... eu é que não percebi que perceberam) mas aplaudiram. Com cerimónia, que nunca se sabe se é de bom tom aplaudir quando alguém chora, ou se lamenta.

Há muito fado no Funchal. Muito fado anunciado e sem sotaque, o que é mais triste ainda. O que eu ouvi, não tinha e é desse que falo. Testemunha de um fado sem acento, no meio de tanto ar, tanto mar. Você que inventou a tristeza, ora tenha a fineza, de desinventar, canta o Chico nos meus auriculares, num dia assim – imagino – empalhado como este. Como por acaso – embora não haja acasos – uma vela vermelha florescente invadiu a parcela do meu oceano e calmamente, desapareceu à esquerda do meu olhar. E regresou com uma outra companhia, outra prancha de wind surf, esta amarela e, calmamente, cruzaram-se comigo, com o meu olhar anónimo e longínquo, mas porém, tão próximo e com nome. Adeus.

funchalices 3

Da minha varanda vejo um padaço grande de oceano atlântico, liquido e calmo. A grande água fica à distância de vinte-trinta passos. Dos meus. Um barco grande passou há pouco e deixou o mar em revolução. Os canoistas estão em apuros. Ora são lançados ao ar, ora penetram na profundade das águas, como se estivessem a borde uma montanha russa de azul. Ao longe, a água está tracejada de ondas que, por serem um pouco mais escuras, parece pedir para ser rasgada por aquele picotado emocional, bi-polar. Para lá delas, a calma que parece prosseguir. Deste lado, os canoístas – em trânsito intenso – procurando retomar a sua marcha.

O oceano, esse, continua o sua actividade natural de fábrica de peixes. Hei-de comer um, ao almoço.

segunda-feira, julho 26, 2010

funchalices 2

A missa das 18h30 de domingo, enchia a nave central da Sé do Funchal.

Era tanta gente (é certo que nem todos os bancos estavam preenchidos, havia espaço no meio deles, onde se poderiam mais pessoas encaixar) que o ofertório começou logo depois da homilia.

Paulatinamente, dois homens (rapazes), sem aparente pressa, ergueram os sacos das esmolas (não se chamarão certamente assim...) construídos em veludo vermelho e montados na extremidade de uma longa vara de (aparentamente) prata e, tacteando entre os corpos, passeavam-no por entre as pessoas instaladas nos bancos. Sempre que passavam para o banco seguinte, caminhando para o fundo da igreja, batiam com o bastão no chão fazendo chocalhar as moedas no saco de veludo e seguiam viagem. Se alguém estivesse mais envolvido na prece, o barulho acordá-las-ia, que a esmola não espera recolhimentos vadios.

funchalices 1

Perto do Mercado dos Lavradores, um rapaz passou, correndo, como se fizesse jogging, em tronco nu, mas com um papagaio branco (suponho que era um papagaio) pousado no ombro. Como quisesse correr mais depressa, galgando os metros que o separavam sabe-se lá do quê, tirou o papagaio do ombro, encaixou-o na baía do peito onde a terra-osso termina, e acelerou o passo. O papagaio, amparado pelas mãos vigorosas do rapaz, gritava: um-dois-um-dois-um-dois e por aí adiante.

O rapaz desapareceu numa curva do caminho.

quarta-feira, julho 21, 2010

doidices...

Estou muito cansado. À espera de um milagre qualquer, que alguma coisa ou alguém que me rescuscite dos quase mortos de cansaço. Ontem à noite caminhei para casa, arrastei-me para casa (talvez seja mais justo dizê-lo assim), empurrado por não sei quantas estrturas de transporte de passageiros nacional, à mercê delas, das companhias de transporte, que não dialogam, que não se articulam, numa seqência de esperas que, como diz o povo, não matam mas móiem, embora eu pense que matam, e matam muito.

E numa dessas paragens a que fui sendo forçado, longa a paragem e longa a morte, li. Procurei os jornais locais, os do norte carago, e folheei-os com duplo sentido: para matar, eu mesmo, o tempo que faltava passar e que as companhias teimavam em dilatar; e para saber o que acontecera no entretanto.

E li.

Por exemplo, que a câmara do Porto, talvez a sua assembleia municipal, recusara a proposta - não percebi de quem - de dar o nome do escritor José Saramago, a uma rua tripeira.

Francamente, não prcebi o argumento da recusa, tão escandalizado fiquei com ela, assim simplesmente.

A autarquia tripeira, é certo, que não pára de me surpreender. No plano cultural, então, tem sido um fartote.

Mas isto...

Na mesma linha da lógica da ausência presidencial no funeral do escritor acontecido recentemente, esta liminar recusa vinca o extremismo de que somos capazes, já não apenas circunscrito à vida das pessoas, mas muito para lá dela. Se a mim não me escadalizou a ausência cavacal nas cerimónias fúnebres de Saramago – afinal a presidência da república esteve representada – já a esfarrapada desculpa sim, era ofensiva e merecia tau-tau.

E agora isto. Mesmo que lhe desconheça os agumentos arredondados, que os há-de ter. E talvez conclua, daqui a uns tempos, que são piores as razões para a recusa, que a recusa, ela própria. Que nisto, as instâncias políticas têm a capacidade suplementar da superação.

Somos um país singular, concluo. Capaz das coisas mais contraditórias. Somos o país de Saramago, para usar este caso recente, e dos que o não toleram, nem depois da morte.

Se este também é o glorioso pais que somos, o glorioso pais que temos, é também a mágica nação em transformação constante, cantante, cantada mas mal vivida, exaltada, burgessa, opaca, cinzenta, mesquinha, mosquinha morta, invejosa, tendenciosa, pequenina, achincalhona, vingativa, anã (com o respeito todo pelos amigos mais pequenos em fisicalidade que não em carácter, que é o que ela é), provinciana, parola, e sei lá que mais.

Mas não há ninguém que lhe baixe as calças e lhe dê meia dúzia de açoites no rabo?

quinta-feira, julho 01, 2010

ekprasis

Sexta, Sábado e Domingo, dias 2, 3 e 4 de julho, no Museu Nogueira da Silva, o Sindicato de Poesia apresenta o recital (ou melhor dizendo, "Plenário Poético"), EKPHRASIS.

Sempre às 21h45, este Plenário é uma VIAGEM no interior da Casa que agora é Museu.

http://www.youtube.com/watch?v=WdH2gx_uP0Q

Depois destes dias, só em Guimarães, no final de Setembro, quando o Sindicato "habitar" outra casa na quase capital europeia da cultura.

A Europeia

Estreou ontem no Teatro Helena Sá e Costa, no Porto, e está em cena até segunda-feira, inclusive, o espectáculo A EUROPEIA, com encenação de Fernando Mora Ramos, projecto que coordenei.
No momento em que se rediscute a Europa, este espectáculo vem na fora certa.

Importa dizer, que este é o espectáculo de fim de curso da ESMAE (Escola Superior de Música e das ARtes do Espectáculo).