sexta-feira, dezembro 11, 2009

oliveira

A data não é redonda.
No ano passado, sim, é que era coisa para festejar. E foi-o! Foi festejada com pompa e circunstância. Este ano, porém, apesar de capicua, arrisca-se a passar despercebida. Por isso, quero começar por recordá-la, eu mesmo, neste espaço.
Aqui vai:
Faz hoje 101 anos que nasceu Manuel Cândido Pinto de Oliveira, conhecido no mundo português, mas não apenas, por Manoel de Oliveira. Algumas coisas aconteceram no entretanto, ou no espaço destes cento e um anos. O «u» de Manuel transformou-se em «o», (se é que alguma vez foi «u») e o nome, já de si não tão pomposo como isso, transformou-se numa coisa mais simples, como o cinema que dizem que ele faz.
Nasceu no Porto a 11 de Dezembro de 1908, mas parece que apenas foi registado no dia seguinte. Ou seja: oficialmente, só faz anos amanhã.
Apesar da idade, que não é «apesar» nenhum, continua em pleno a filmar e a planificar filmes como se não fosse nada com ele. Ou como se fosse tudo com ele, com a certeza das coisas que faz, apesar das dúvidas que diz continuar a experimentar. E para que continue a fazer o que quer, sem constrangimentos de qualquer espécie, abandonou o produtor cm quem trabalhou durante tantos anos, (e esta mudança não é uma mudança de agora, já tens um bom par de anos), e avançou com nova equipa de produção, talvez mais seguro do que quer fazer, e mais certo do que não quer fazer.
Um exemplo quase único num país que trata os seus mais velhos cidadãos como coisa usada, gasta, que enxota para vielas sociais, que maltrata com pensões de sobrevivência miseráveis, depois de vidas inteiras gastas ao serviço do bem comum. Gente que construiu coisas, que ganhou activamente a sua vida, que do que ganhou pagou ao estado quase metade dos seus proveitos mensais. E depois de tantos exemplos de sacrifício, de tanta dedicação (mesmo que em muitos casos, contrariada) o Estado malbarata esta tanta inteligência, tanta dedicação, tanta experiência, tanto saber, tanta entrega. E fá-lo duplamente, porque livrando-se dos mais velhos, fomenta, por exemplo, com apoios e subsídios, lares que são arrecadações sem préstimo, onde os nossos mais velhos são engavetados sem escrúpulos, explorados por homens e mulheres sem carácter, como as tantas notícias deixam perceber.
Os nossos mais velhos a quem presenteamos com 80 euros de complemento solidário para idosos, em condições muito especiais. Entregamos o cheque e ficamos à espera das televisões para que, com elas, chegue também o reconhecimento público e os votos em próximas eleições.
Do mundo dos mais velhos de onde chegam notícias aterradoras todas os dias: no ano passado, por exemplo, a Linha do Idoso da Provedoria da Justiça, contabilizou 3348 chamadas dos nossos pais ou nossos avós, queixando-se de maus-tratos e de falta de condições mínimas de vida. E este número apenas contabiliza os que, com coragem, fizeram a denúncia, ou que, pura e simplesmente, se cansaram de esconder.
Nem todos podem ser Manoeis de Oliveira, eu sei.
Porque como diria o outro, uma andorinha não faz a primavera.
Neste caso, infelizmente.

terça-feira, dezembro 08, 2009

magalhães

A pantanização crescente da política portuguesa, leva a que todas as desconfianças sejam possíveis, mesmo as que aqui há uns tempos eram impensáveis, fora de lógica, profanas mesmo.
Os casos sucedem-se a uma velocidade tal que, tantas vezes, o que primeiro se estranha, logo se entranha, como na velha publicidade à cola-cola, inventada por Fernando Pessoa. E já agora, lembro que o espólio do poeta estará disponível on-line durante o ano que se apresta para entrar. Isto é que é uma boa notícia.
O primeiro-ministro, e isto para voltar ao assunto que aqui me traz, vai de escândalo em escândalo, navegando à bolina, numa demonstração de capacidade de sobrevivência digna de registo. Por muito menos, já tantos ministros e primeiros-ministros caíram, aqui e em outros lugares da terra. Mas Sócrates não, aguenta-se estoicamente, mesmo que fique despenteado na fotografia.
Ora - e não serei eu a fazer justiça antecipada e na praça pública – li algures que devemos desconfiar de alguém que se martiriza a tal ponto, sacrificando a vida privada e a honra pública, logrando arrostar com os horrores da difamação em prol do que a sua presença faz ao bem comum, à política, ao partido (o seu) e a Portugal. Devemos desconfiar – e não sou eu que o digo, já o escrevi – dos que pensam que são essenciais para o que quer que seja e que são escolhidos sabe-se lá por quem, para fazer o bem público. No fundo, devemos desconfiar dos que se acham Messias. Esses são os mais perigosos.
O nosso primeiro-ministro está envolvido em tantos escândalos que já lhe perdemos a conta. Nem vale a pena puxar pela cabeça, para os recordarmos, que eles saltam na memória como pipocas. Alguns eram tão vis, tão mesquinhos, tão baixos, que nem vale a pena trazê-los aqui à colação. Como aquela história que enfatizava o seu putativo interesse sexual diferente da norma (mas hoje, sabe-se lá qual é a norma) como se isso fosse coisa que devesse interessar ao cidadão. Já outras, reportando-se à sua acção profissional (primeiro como estudante da Universidade Moderna e, depois, como engenheiro encartado numa câmara do país), traziam preocupação porque deixavam transparecer, ou uma campanha orquestrada, ou a sua indisfarçável tendência para o desvio compulsivo.
E depois, já enquanto governante, os casos sucederam-se.
Este último, que mesmo que ainda não o sendo já mostra ter todas as condições para se tornar em mais um cavalo de batalha, pode revelar-se mais gravoso que o chamado Caso Freeport. Que, como se sabe, não é carta fora do baralho. Nas próximas eleições voltará à liça, que este é um caso para durar e aparecer de quatro em quatro anos. Refiro-me ao Caso Magalhães e a uma Fundação Estatal para as comunicações, que não se sabe bem como funciona e se funciona e onde funciona, e que tem todos os condimentos para apimentar mais uma polémica galvanizadora. Isto a crer na atenção das oposições.
Estará o primeiro-ministro disposto a mais este sofrimento, martirizando-se por todos nós? Ou, cansado, provoca novas eleições?
Nesse caso lá chegará mais um episódio do Caso Freeport. É certinho.

terça-feira, dezembro 01, 2009

honra ao nobel da paz 2009

A quem disse… (a quem ousou dizer)… que Obama, o messiânico presidente norte-americano, nada fizera (pelo menos que se visse) para merecer o prémio Nobel da Paz, eis a resposta que certamente merecia. Porque a verdade pode tardar, (e quem diz a «verdade», diz a «justiça») mas nunca falha.
E ela chegou, bramante, sonora, altíssima.
Na quarta-feira da semana passada, o presidente indultou «Courage» e «Caroline», dois insignes perus que, por esta via, se salvaram de ser cozinhados no tradicional jantar de Acção de Graças, cerimónia que milhões e milhões de famílias norte-americanas cumprem escrupulosamente.
Segundo relatou a LUSA, agencia noticiosa nacional fazendo eco de outras tantas centrais de notícias do mundo inteiro, numa cerimónia realizada no alpendre da Casa Branca, Obama, acompanhado pelas filhas Malia e Sasha, perdoou a vida de «Caroline» e «Courage», que se pavoneavam, mais ou menos indiferentes, diz-se, perante o olhar atento dos jornalistas. «Courage» ainda ostentava na peitaça uma placa que dizia «bom apetite senhor presidente». Felizmente que a perua não sabia ler nem escrever. E mesmo que soubesse, leria a placa ao contrário. Do mal, o menos.
Os dois perus têm, até, para lá de nome, bilhete de identidade e passaporte devidamente carimbados: «Courage» viajou desde uma quinta de Goldsboro, na Carolina do Norte, onde cresceu sob os cuidados de Walter Pelletier, director executivo da Federação Nacional do Peru, presente no acto. De «Caroline» não se conhece tão detalhadamente a história, pelo menos a avaliar pela notícia que consultei, mas deve ser, em tudo, idêntica ao do seu companheiro. Ou companheira.
Parece que, segundo a tradição, os presidentes americanos são presenteados nesta ocasião, com dois perus, oferecidos pela Federação Nacional do Peru. Não o Peru-país, mas o peru-animal. Nada de confusões, que de imperialismos está o mundo cheio. Esta tradição, diz-se, remonta ao tempo do presidente Abraham Lincoln. Mas é, desde o mandato de Kennedy, que o destino dos animais deixou de ser o prato do presidente, e passou a ser instituições de caridade, primeiro, e mais recentemente, como neste caso, a Disney e o mundo do espectáculo.
Antes de serem entregues ao presidente, para a cerimónia de indulto – os americanos sabiam – os animais pernoitaram no Willard, um hotel de luxo situado a dois passos da Casa Branca. "Ficaram numa casa de banho, protegidos por uma lona e um monte de palha», esclareceu Barbara Bahny, porta-voz do hotel.
Toma!
Isto só para calar aqueles vozes que diziam que Obama não mereceu o Nobel da paz.
Mas lembram-se? Já Bush, o presidente anterior, tinha poupado perus (pelo menos dezasseis) e apesar disso, nada. Até se tinha feito filmar, hélas, entregando um peru de plástico às forças armadas americanas, estacionadas, creio que no Afeganistão. E nem por isso recebeu o Nobel. Pelo contrário. Riram-se dele. Eu incluído.
Há presidentes que merecem mais que outros, essa é que é essa.